Inúmeras vezes ouvimos de pessoas que acabaram de recolher um animal da rua dizer: “Ah! Se eu tivesse dinheiro para montar um abrigo!”. Fica bem claro, com este sonho, que elas nunca visitaram um, para saber a realidade.
Um abrigo começa sempre com as melhores intenções. Se quem o abre tem uma certa dose de “pé no chão”, imagina um número limite de animais a serem abrigados. Mas o objetivo nunca é atingido. Seja porque se condói dos animais abandonados que encontra; ou dos casos tristes que donos contam para deixar a responsabilidade na mão do outros; ou ainda, daqueles que abandonam na porta, ou jogam animais lá dentro.
Em pouco tempo o limite anteriormente fixado é expandido. E quem pensava ter 50 animais se vê com 100, 200 para alimentar, vacinar, manter limpos, higienizar as instalações, etc. Já ouvi histórias de fortunas perdidas em sonhos de abrigo. Recentemente a de uma senhora que estava sendo obrigada a sacrificar os animais mais idosos e doentes por não poder mantê-los, mesmo em precaríssimas condições. Depois de seu patrimônio ter se acabado, passado pela fase de pedir ajuda aos amigos, depois parentes, depois aos desconhecidos, por fim a veterinários e à Proteção Animal para sacrificar os animais aos quais ela sonhou dar uma vida melhor ou salvar da morte nas ruas.
Abrigo não é solução, é problema gerado pelo descaso social. Do lado oposto de quem sonha montar um, existe a crença das pessoas em geral de que basta pegar um animal na rua e metê-lo num abrigo para resolver o problema. Quantas vezes ouvimos “leva pra Sociedade Protetora dos Animais…” Se visitassem algum abrigo dos muitos existentes por aí, veriam a triste realidade: Dezenas, até centenas de animais se digladiando por comida, muitos doentes, e até casos de canibalismo gerados pela fome. Mas ninguém pensa em como a “Sociedade Protetora” vai conseguir recursos.
O que a sociedade não vê, está muito claro para nós que lidamos com o problema 24 horas por dia: em vez de abrigo, dar lar transitório, uma casa de apoio. O animal é tratado, vacinado, esterilizado e doado. E isso, por vezes, demora meses.
Como doar tantos animais e os resultantes dos naturais cruzamentos, que nascem aos montes todos os dias? Como achar donos suficientes (e responsáveis) que os adote?
Informando e educando as pessoas sobre posse responsável e fazê-las compreender que esterilizar cães e gatos (fêmeas e machos) é a única solução possível para o abandono de animais em massa com que convivemos.
Mas o que é desesperante é ver ainda veterinários aconselharem donos a deixar seus animais ter a primeira cria para só depois esterilizá-los; donos darem a desculpa de que “esterilizar faz o animal engordar” (é só continuar dando a mesma quantidade de alimento que isso não acontece); desculpa da “falta de dinheiro” (quando a Prefeitura e os grupos da Proteção oferecem cirurgias a baixo custo ou mesmo gratuitas); e da anti-social indústria dos criadores.
E estas mesmas pessoas ainda têm coragem de dizer que gostam de animais, deixando nascer aqueles que serão doados para qualquer um. Ou se alimentar de lixo. Ou morrer atropelados. Talvez sarnentos, famintos, num abrigo irremediavelmente sem recursos, sem ao menos o carinho de um dono”.
Por Ana Lúcia Leão
Jornalista. Membro do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal