Uma tese de pós-graduação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) pode representar uma vacina contra a leishmaniose, uma doença cruel que causa lesões renais, hepáticas, cardíacas e mata cães e seres humanos.
Ela é causada por parasitas protozoários de mais de 20 espécies diferentes de Leishmania, que mata cerca de 50 mil pessoas todos os anos no mundo. Apesar de já existirem vacinas para cães, a pesquisa traz, pela primeira vez, uma vacina capaz de imunizar todas as variações de Leishmania.
“Já existe a Leish-Tec, vacina desenvolvida também na UFMG, para cães. A pesquisa realizada em meu doutorado traz, pela primeira vez, uma vacina de amplo espectro capaz de induzir uma proteção imune frente a diferentes espécies de Leishmania”, diz Lourena Costa, estudante do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFMG.
No trabalho, ela testou antígenos que podem ser usados no desenvolvimento de vacinas e métodos de diagnóstico para leishmaniose visceral, humana e canina. A ideia é que a vacina desenvolvida por Lourena seja testada já em 2018.
A tese “Biotecnologia de phage display” foi vencedora, em 2017, do Grande Prêmio UFMG de Teses na área de Ciências Agrárias, Ciências Biológicas e Ciências da Saúde.
Vacina
Para desenvolver a vacina e o método de diagnóstico, a pesquisadora utilizou a ferramenta de phage display. Trata-se de uma técnica de clonagem da biologia molecular que possibilita a seleção e o isolamento de vetores gerados de bibliotecas de genomas.
Por meio de fagos, que são vírus que infectam apenas bactérias – os bacteriófago – a técnica de phage display investiga o comportamento das proteínas e o rastreamento de antígenos.
“Buscávamos antígenos para uma molécula-alvo. Na minha pesquisa, essa molécula-alvo são os anticorpos dos pacientes, humanos ou caninos, portadores da leishmania ativa. Colocamos os anticorpos dos doentes em uma solução com vários fagos diferentes. Alguns se ligaram à molécula e ali ficaram aderidos”, explica a pesquisadora em comunicado.
No caso do diagnóstico, ela acrescenta que os fagos introduzidos na solução conseguiram identificar o que era positivo e o que era negativo para a doença. “Foi possível separar amostras de pessoas sadias ou que têm outras doenças, como Chagas, cujo diagnóstico é comumente confundido com o da leishmaniose”, diz.
Com base nas observações das moléculas conectadas, a pesquisadora realizou testes para apurar essas ligações. Os testes possibilitaram o desenvolvimento do exame que diagnostica os dois tipos da enfermidade e da vacina, também para as duas modalidades.
As duas descobertas podem beneficiar humanos e cães.
Imunoterapia alternativa
No próximo mês, Lourena Costa embarca para a Inglaterra para um intercâmbio em que pretende aprender a técnica da fagoterapia, que consiste em inocular nos pacientes os fagos indicados para atacar a doença.
Para a pesquisadora, a fagoterapia associada ao tratamento com medicamentos tradicionais trará muitos benefícios para os pacientes.
“O tratamento da leishmaniose é muito agressivo e causa lesões renais, hepáticas e cardíacas. A fagoterapia é uma boa opção terapêutica, por ser capaz de diminuir a toxicidade do tratamento, melhorando o sistema imune do paciente. Quero aprender a técnica para aplicá-la no Brasil, utilizando a descoberta descrita na minha tese”, diz.
Em sua estada na Inglaterra, a pesquisadora também pretende se reunir com grupos de pesquisa e empresas que auxiliem no desenvolvimento de um biossensor, para que o exame de diagnóstico da leishmaniose seja feito rapidamente e em grande escala.
O objetivo é comercializar o biossensor já no ano que vem. “Esperamos contar com um exame prático e rápido, em que a amostra de sangue será colocada em uma fita, e o resultado sairá automaticamente”, conta.
Testes em 2018
O grupo de pesquisa integrado por Lourena planeja iniciar os testes da vacina em 2018, com hamsters, e em um futuro próximo em cães, por meio de parceria com a Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop).
Só depois poderão ser feitos os experimentos em primatas e humanos.
“Como os fagos não são patogênicos, poderemos testar a vacina em humanos mais rapidamente. A leishmaniose ainda mata, e há muitos casos subnotificados. Com diagnóstico rápido, sensível e específico, teremos condições de tratar os pacientes e evitar os óbitos”, afirma a autora do trabalho.
Com informações da UFMG