Projeto de lei propõe entrada de pets em hospitais e clínicas de Montes Claros; tutores e especialistas defendem iniciativa

Uma das visitas feitas pelo Golden da Alegria — Foto: Golden da Alegria/Divulgação

Audiência pública para discutir projeto foi realizada, mas ainda não há previsão para votação; em um hospital da cidade, paciente que fez o pedido de visita e foi atendida relata benefícios.

Raíssa Mendes passou 15 dias internada em um hospital. Durante esse período, como a maioria dos pacientes que faz tratamento de saúde, recebeu as visitas de amigos e familiares, mas sentia falta de seus dois cachorrinhos, Amora e Pingo. A saudade dos bichinhos fez com que Raissa tivesse uma ideia, pedir autorização da unidade de saúde para receber a visita deles.

Histórias como a de Raissa podem se tonar mais comuns em Montes Claros. A Câmara de Vereadores discute um projeto de lei que permitirá aos pacientes receber as visitas de pets em clínicas e hospitais. “Eu demorei para fazer o pedido, por imaginar que não permitiram. Recebia várias visitas, mas eles também são minha família e me faziam muita falta. Sempre fui apegada, sentia muita saudade, sabia que eles estavam sendo bem tratados, mas tinha muita vontade de vê-los”, fala.

Raíssa com Pingo e Amora — Foto: Raissa Mendes/Arquivo pessoal

Raíssa conta que Pingo apareceu no momento em que ela estava procurando por um bichinho para adotar; ele foi resgatado por uma protetora. Já Amora é da raça pinscher e é cria da cadela da mãe de Raíssa. Para que o encontro com os pets acontecesse, foi necessário cuidados especiais; uma área externa da unidade de saúde foi o local escolhido. “A equipe do hospital discutiu o caso e fez algumas exigências, os dois tinham que estar limpos e com as vacinas em dia”, lembra.

Ana Paula Guerra, diretora assistencial do hospital que permitiu a visita, diz que o caso de Raíssa Mendes foi o único pedido deste tipo até o momento. Ela destaca que a instituição está aberta a essas solicitações e faz algumas ressalvas.

“A paciente fez a solicitação falando que a presença dos cachorrinhos era importante para ela e, como priorizamos o bem-estar dos pacientes, verificamos junto ao médico infectologista a possibilidade. Requisitamos ainda o cartão vacinal e um laudo veterinário do bichinho. Precisamos avaliar se o paciente está habilitado a receber a visita e se o animal apresenta as condições para ter esse contato. Cada caso precisa ser avaliado, mas iremos tentar acatar aos pedidos dentro das possibilidades”, explica.

O encontro aconteceu sob supervisão da assistente social, psicóloga e enfermeira.

Sobre o projeto de lei

O projeto de lei municipal foi proposto pelo vereador Valcir Soares Silva (PTB). Segundo o parlamentar, iniciativas deste tipo já estão sendo colocadas em prática em outros lugares do país e têm resultados comprovados em favor da recuperação dos pacientes. No fim de junho foi realizada uma audiência para discutir a proposta.

“Durante a audiência, tivemos a oportunidade de discutir o projeto, que é complexo, por ser uma questão de saúde. Antes de colocá-lo para votação, queremos melhorar o que está sendo proposto, visando o bem-estar e a segurança dos pacientes. Tivemos a presença de representantes de três hospitais, faculdades, veterinários, protetores de animais e da sociedade”, explica Valcir.

Foi criado um grupo de trabalho para estudar o assunto e os vereadores também devem fazer visitas em lugares que oferecem a possibilidade das visitas. Ainda não há previsão para que o projeto seja colocado em votação.

Experiência com humanos e animais

Com 30 anos dedicados a cuidar de pessoas, a enfermeira Sandra Regina de Oliveira decidiu, há 13, se profissionalizar em outra área. Estendendo sua atuação aos bichos, ela se formou em Medicina Veterinária. Antes de vir para Montes Claros, onde trabalha atualmente em um hospital, atuava em uma unidade de saúde em São Paulo, voltada para tratamento de pacientes cardíacos.

“Tínhamos a cada 15 dias a presença de animais. Começamos pela pediatria. Era nítida a redução do medo, da ansiedade, do estresse nas crianças. Além disso, elas se tornaram mais receptivas ao tratamento”, lembra a veterinária que tem 15 cachorros e 12 gatos, e carrega rações, potes e água no carro para distribuir para os animais de rua.

Sandra Regina, que é enfermeira e veterinária, com as cadelinhas Isabelle e Sophia — Foto: Sandra Regina/Divulgação

Sandra Regina exemplifica a importância do vínculo entre os pacientes e os pets por meio de um caso que ela acompanhou. Um paciente que estava por meses internado no hospital onde ela trabalhava pediu a visita de um cachorro.

“Por conta do tempo de internação, ele desenvolveu um quadro de depressão, mas depois de ver o bichinho ele foi melhorando e teve alta rápido. Minha mãe, quando ficou internada aqui em Montes Claros, foi para casa debilitada. A primeira coisa que ela perguntou quando chegou em casa foi cadê Sophia?”, comenta Sandra, ao lembrar do pedido da mãe para ver uma das cadelinhas da casa.

Para a veterinária, os animais ajudam na melhora do estado emocional dos pacientes, que reflete diretamente na saúde física. “Sou totalmente a favor da presença dos bichinhos, mas não basta o hospital estar aberto a permitir a visitação. É preciso planejamento, análise das condições dos pacientes e também dos animais, que precisam apresentar características para lidar com esse ambiente e com as pessoas em tratamento”, finaliza.

Golden da Alegria

Em Montes Claros, um grupo de pessoas tem levado a idosos que vivem em asilos e crianças de abrigos um pouco de alegria através dos animais. O sentimento foi usado, inclusive, para dar nome à iniciativa. O projeto Golden da Alegria conta com a participação de 10 cachorros da raça.

Uma das visitas feitas pelo Golden da Alegria — Foto: Golden da Alegria/Divulgação

“Nosso projeto começou quando vimos a campanha de Natal [cidade do Rio Grande do Norte] de um asilo. Entramos em contanto e preparamos uma visita”, explica Sandra Guimarães, participante do projeto.

Sandra, que faz parte de um grupo de tutores de goldens que reúne mais de 140 pessoas, adotou a Margarida com nove meses e se encantou com a raça. Depois de anos de convivência, ela cita exemplos de amor e carinho do pet.

“Quando a peguei, pensei como seria com meu pai idoso. Nunca vou me esquecer da cena, quando chegamos em casa, ela chegou perto e encostou a cabeça no colo dele. Em uma das nossas visitas, havia uma idosa acamada, um dos goldens foi até o quarto, subiu na cama e deitou ao lado dela. Eu faço caminhada todos os dias e passo em frente a uma escola. Uma criança especial olhou Margarida e sorriu, agora ela espera para vê-la, vem ao encontro e a abraça. Os animais são assim oferecem amor, carinho, atenção sem cobranças. Eles não esperam nada em troca”, diz.

Parte do grupo Golden da Alegria — Foto: Golden da Alegria/Divulgação

Por G1 Grande Minas